Este é um ensaio de prospectiva baseado em sondagem de expectativas e no monitoramento de cenários da Macroplan. Não pretende eliminar antecipadamente as incertezas relativas à macroeconomia e às eleições presidenciais do Brasil em 2022. Isso é impossível. Seus propósitos são: (1) ajudar os leitores a organizar e reduzir suas incertezas sobre o tema; e (2) constituir o ponto de partida para uma atualização sistemática dessas “cartas de navegação” em meio às incertezas.
1. Incertezas Críticas para 2022
Daqui a um ano, já saberemos quem governará o Brasil de 2023 a 2026. Por enquanto, muitas incertezas e algumas tendências pairam entre nós.
Na nossa visão atual, duas incertezas se destacam entre as demais:
- Uma política: qual a chance de um terceiro candidato(a) passar para o 2º turno contra um dos dois atuais preferidos nas pesquisas de opinião (Lula ou Bolsonaro)?
- Outra econômica: qual a probabilidade da economia brasileira em 2022 melhorar sensivelmente, por exemplo um crescimento econômico maior que 2,5% e inflação menor que 5,5%?
Os desdobramentos e combinações dessas incertezas configuram cenários que, ao longo do tempo, poderão ter chances de ocorrência alteradas em função das percepções e expectativas dos eleitores brasileiros.
2. Expectativas Atuais e Probabilidade dos Cenários
Para avaliar tais incertezas e as tendências derivadas, fizemos uma sondagem de expectativas junto a 250 integrantes das redes da Macroplan no período de 9 a 16 de novembro. As pessoas sondadas são bem-informadas e constituem uma amostra não aleatória de executivos, políticos, gestores, acadêmicos e especialistas dos setores privado, público e do 3º setor de todo o Brasil. Têm visões de mundo e convicções diversificadas.
Obtivemos 141 respostas (56%), cujo efeito cruzado configura quatro cenários distintos para os resultados das eleições presidenciais de 2022.
Hoje, o cenário mais provável, com 42% de chance, segundo as expectativas dos respondentes, é de polarização entre Lula e Bolsonaro no 2º turno, com crescimento econômico baixo (ou mesmo nulo ou negativo) e inflação superando os 5,5% a ano. Um cenário que tende a favorecer o candidato Lula.
O 2º cenário mais provável, com 30% de chance, é de um 2º turno entre um 3º candidato e Lula, também em um contexto de crescimento econômico baixo e inflação significativa. Ainda é prematuro antecipar um favorito.
A polarização Bolsonaro x Lula retorna no 3º cenário, com 17% de chances – segundo a sondagem da Macroplan – mas com um panorama diverso: a economia cresce com mais vigor, superando os 2,5% ao ano e a inflação no máximo alcança a metade da carestia deste ano. Um cenário mais favorável à reeleição de Bolsonaro.
Por fim, o cenário hoje avaliado como menos provável, com 11% de probabilidade, segundo os respondentes da nossa sondagem é de um confronto entre um 3º candidato e Bolsonaro num contexto de economia em expansão e inflação cadente.
Hoje em dia, os dois últimos cenários são menos prováveis (28%) uma vez que nem o Ministério da Economia espera um crescimento econômico exuberante para 2022: recém diminuiu sua projeção de expansão do PIB para 2,1%. Já o mercado segue reduzindo suas expectativas de crescimento a cada semana: nas últimas 5 semanas reduziu sua estimativa média de crescimento do PIB de 1,4% para 0,58%, segundo o Boletim Focus das edições de 22 e 29 de novembro. Mas muitos analistas já estão “precificando” 2022 como mais um ano de crescimento próximo de zero ou mesmo de recessão.
Ainda é muito cedo para fazer apostas mais firmes, pois o Brasil é um país fértil em instabilidades e surpresas. O jogo político ainda está muito aberto. Mas a economia, ao que a maioria dos sinais indica, continuará em marcha lenta ou mesmo retornando à situação de “baleia encalhada”.
3. Fontes de Incerteza que devemos monitorar
As expectativas dos atores relevantes (no caso, os candidatos, seus blocos de apoio e os eleitores) evoluem sob a influência muitos fatores. Na nossa avaliação, quatro fontes de incerteza devem merecer atenção especial e monitoramento sistemático.
1ª Fonte de Incerteza: A evolução da COVID-19 e da saúde pública no Brasil
A intensa e veloz disseminação da variante Ômicron, com epicentro por enquanto localizado no sul da África, é um sinal de alerta para a evidência de que (infelizmente) é cedo para considerarmos definitivamente superada a possibilidade de novas ondas da pandemia do COVID-19.
Figura 1. Infecções da COVID estão crescendo mais rapidamente na província de Gauteng mas as internações hospitalares seguem no mesmo ritmo das ondas anteriores
As duas questões críticas para nós brasileiros, nesse campo, em 2022, são: (i) como essa e novas ondas (potenciais) de pandemia se propagarão no Brasil que, hoje em dia, já tem mais de 62% da população totalmente vacinada (duas doses ou dose única) e (ii) como evoluirá o perfil epidemiológico mais amplo de nossa população?
2ª Fonte de Incerteza: A evolução da inflação e da massa real de renda das pessoas
O aumento de preços em 2021 já era esperado em todo o mundo, em virtude não só da grande queda de preços ocorrida em 2020 mas também da ruptura e/ou rearranjo das cadeias de suprimento e da reconfiguração dos mercados de bens e serviços e de força de trabalho. Mas até agora tem sido mais intenso e duradouro.
No caso brasileiro esse aumento está ocorrendo com muito mais força, velocidade e amplitude. A desancoragem de expectativas inflacionárias (defasagem em relação às metas de inflação do Banco Central) é uma narrativa que começa a emergir[1].
Gráfico 1. Focus – Evolução das Expectativas de Inflação para 2021 e 2022 (Mediana em % ao ano)
Gráfico 2. Focus – Evolução das Expectativas de Crescimento do PIB para 2021 e 2022 (Mediana)
3ª Fonte de Incerteza: o inesperado
O inesperado acontece com maior frequência do que imaginamos. Às vezes sequer os imaginamos. São eventos plausíveis que hoje têm baixa probabilidade de ocorrência, mas que carregam enorme impacto potencial[2].
No caso dos cenários da eleição presidencial brasileira devemos considerar pelo menos as seguintes possibilidades:
- (tentativa de) um golpe. Por exemplo: caso Trump e invasão do Capitólio na última eleição presidencial americana; ou ameaças no Brasil dia 7 de setembro de 2021
- (tentativa de) assassinato de um(a) do(a)s candidato(a)s. Por exemplo: a “facada” no candidato Jair Bolsonaro, em Juiz de Fora, no dia 6 de setembro de 2018.
- Morte súbita de um candidato real ou potencial. Por exemplo, Eduardo Campos em 2014. Ou Aécio Neves (morte moral com o “Joesleygate” revelado em maio de 2017)
Como se vê, até na produção do inesperado nós somos um país fértil!
Há um fator adicional a levar em conta: as narrativas dos candidatos e sua capacidade de viralizar. Esta incerteza evoluirá ao longo da campanha eleitoral de 2022 e será eliminada nas urnas.
Vamos monitorar.
[1] O centro e o teto das metas de inflação do Banco Central são, respectivamente: 3,75% e 5,25% (2021); e 3,5% e 5,0% (2022). A prévia do IBGE para a inflação em 2021 é de 10,73%. A expectativa do mercado (Boletim Focus) para 2022 alcançou o teto da meta (5,0%) em 29/11/2021.
[1] Assemelha-se aos “cisnes negros”, conceito criado pelo filósofo Nassim Teleb e usado para eventos improváveis ou “pontos fora da curva”.