O que as 100 melhores cidades do Brasil têm em comum? Quais fatores são determinantes para o bom desempenho da gestão pública? Para responder estas questões, a Macroplan – consultoria especializada em administração estratégica – comparou as 100 maiores cidades do Brasil (população acima de 266 mil) usando um índice que agrega 16 indicadores nas áreas de educação, saúde, segurança e saneamento. Esses indicadores receberam diferentes pesos: 35,3% para educação e cultura; 35,3% para saúde; 20,6% para infraestrutura e sustentabilidade e 8,8% para segurança. Com isso, o ranking das 100 melhores cidades, analisados no período de uma década, foi formado por um índice que vai de 0 a 1, em que quanto mais próximo de 1, melhor é a condição de vida nessa cidade.
O estudo Desafios da Gestão Municipal (DGM) mostrou que as cem cidades mais populosas do país representam 39% da população brasileira, produzem 50% do PIB (Produto Interno Bruto) e respondem por 54% dos empregos formais do país. A região Sudeste é a que concentra a maior parte delas: 49 municípios, sendo 8 deles entre os dez melhores ranqueados.
De acordo com o levantamento da Macroplan, Maringá (PR) é a melhor cidade grande do País. A cidade subiu no ranking, assim como os outros cinco municípios que aparecem no topo do estudo: Piracicaba, São José do Rio Preto, São José dos Campos, Franca e Campinas. Do ranking das dez primeiras, oito estão no estado de São Paulo. Apenas Maringá e Curitiba quebram essa hegemonia. Por outro lado, Ananindeua (PA), Belford Roxo (RJ) e Macapá (AP) estão entre os piores resultados entre as 100 maiores.
Adriana Fontes, economista sênior e coordenadora do núcleo de estudos da Macroplan, explica que a análise, que trabalhou com dados de 2015 (os mais recentes disponíveis), mostrou que há avanços nos indicadores do grupo das 100 maiores cidades em várias áreas com risco de retrocesso no atual contexto de crise, como tem ocorrido sobretudo na área de segurança. “Além disso, o estudo através do indicador sintético mostra situações e trajetórias muito distintas entre as cidades com destaque para três questões”, explica.
Disparidades regionais
Em primeiro lugar, as disparidades regionais. Os resultados confirmam as abismais disparidades entre as regiões do país: os municípios do Sul e do Sudeste dominam as 25 primeiras colocações do índice geral. Entre os 25 últimos, predominam representantes do Norte, Nordeste e da periferia da região metropolitana do Rio de Janeiro.
Em segundo lugar, o desempenho das cidades médias. Quatro das cinco melhores do ranking são cidades com até 500 mil habitantes: Maringá-PR, Piracicaba-SP, São José do Rio Preto-SP e Franca-SP. Além disso, as cidades médias foram as que registraram as maiores variações positivas no ranking.
Em terceiro lugar, destaca-se o desempenho positivo de São Paulo. Das 10 primeiras colocadas no ranking, 8 estão em São Paulo. Entre as 15 melhores posições, o Estado contribui com 12 cidades.
“O desempenho dos municípios está relacionado a uma série de fatores históricos, socioeconômicos e relacionados à gestão pública. Em geral, a conquista de bons resultados, no médio e longo prazos, está relacionado à continuidade de políticas públicas eficazes, independente dos ciclos políticos e, ainda, de responsabilidade fiscal”, explica a economista.
Desafios atuais
De acordo com Adriana Fontes, os governos convivem com acentuada escassez de recursos e pressões sociais para fazer mais e melhor, além da exigência de mais transparência na prestação de contas. Com o aumento da escolaridade e maior acesso à informação, as pressões por parte da população tendem a aumentar. “A percepção geral é que os recursos são mal utilizados e não são compatíveis com os impostos cobrados. A sociedade espera mais dos governantes e demanda melhores serviços públicos, hoje com elevadas carências e com risco de degradação. O desafio central é atender as demandas da população com restrições de recursos em um cenário econômico e político de instabilidade, com elevado desemprego e, portanto, maior pressão sobre os serviços públicos. O primeiro ano de governo acabou e o momento de ‘arrumação da casa’ passou. Agora, o foco deve ser na entrega de melhores serviços para a população, com criatividade, parceria com o setor privado e maior produtividade”, defende. Para isso, é preciso ter um planejamento focado no desenvolvimento de médio e longo prazos para a cidade, buscando o envolvimento da sociedade, e com estratégias integradas e territorializadas. Para enfrentar tamanho desafio é fundamental trabalhar em parceria com os outros níveis de governo, com o setor privado e com a sociedade civil para mobilizar recursos e competências. “Dadas as restrições orçamentárias atuais é preciso ter foco e direcionar os esforços e recursos para ações que produzam resultado para a melhoria da qualidade de vida da população e aumento da competitividade. Para isso, monitoramento, avaliação e mapeamento de experiências exitosas são imprescindíveis”, ressalta Adriana.
A estagnação econômica impõe limites ao crescimento das receitas que precisam ser respeitados pelo lado da despesa. Mas não se trata apenas de aumentar a receita e reduzir despesas. “É preciso dar maior importância à qualidade e à produtividade do conjunto de políticas. Há um espaço menor para ineficiências na gestão e desperdícios de recursos. O estudo traz indícios de ineficiências na gestão por meio da comparação das trajetórias divergentes e dos descompassos entre gastos e resultados analisados. Há, por exemplo, municípios que gastam o dobro por aluno do Ensino Fundamental e têm um resultado inferior no IDEB”.
Principais déficits
O levantamento da Macroplan mostrou que ainda há déficits evidentes em várias áreas. Na área de saúde, por exemplo, mais de 80% dos municípios têm taxa de mortalidade infantil superior a 10 por mil nascidos vivos, nível, contudo, aceitável pela Organização Mundial da Saúde. Na Educação, dois terços dos municípios não haviam alcançado, em 2015, no IDEB do Ensino Fundamental I público o nível equivalente à média da OCDE em 2003. Na segurança, todas as cidades têm índices mais elevados que a média da OCDE (4,1 por 100 mil habitantes).
Algumas áreas são mais sensíveis a ações de curto prazo enquanto outras demoram mais a reagir. Importante é ter um planejamento que combine ações efetivas e eficazes de curto, médio e longo prazos e monitorar o impacto dessas ações. Há casos de municípios que estavam entre os 10 piores no ranking, em 2005, e passaram a figurar entre os 50 melhores, em 2015. “Ainda existem muitas demandas não atendidas em áreas importantes, principalmente educação e saúde. Reduzir a oferta
e/ou degradar ainda mais a qualidade, sob o argumento de recursos escassos, terá impacto oposto à expectativa da avaliação da população”, ressalta a economista.
Fazer diferente
Maringá, no Paraná, foi a primeira colocada no ranking do IDGM 2017. Com pouco mais de 400 mil habitantes, a cidade se posiciona melhor em saneamento e saúde, com uma taxa de mortalidade infantil abaixo de 10 por 1000/nascidos vivos e a 5ª maior cobertura do pré-natal. Mas a cidade possui também o maior IDEB do Ensino Fundamental I, com 7,1 da rede pública. “Foi a cidade que mais avançou neste indicador na última década. E esses avanços parecem ter sido alcançados com melhor uso de recursos, uma vez que a cidade possui o melhor resultado de gasto por aluno do Ensino Fundamental I”, avalia Adriana Fontes.
Entre as prioridades que devem estar no topo da agenda dos prefeitos destacam-se o aumento da produtividade dos gastos públicos (produzir mais com os mesmos recursos), priorizar os projetos no setor de educação e ter uma governança compartilhada com a sociedade. “Fazer diferente requer o uso intensivo de tecnologias, o estabelecimento de parcerias com outros entes da Federação e com o setor privado e maior direcionamento de recursos para as áreas finalistas com real impacto sobre a qualidade de vida da população”, conclui a economista.