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Quatro cenários para as eleições Presidenciais de 2022

23 de junho de 2022
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    DISCLAIMER: Este é um ensaio de prospectiva baseado em sondagem de expectativas e no monitoramento de cenários da Macroplan. Não pretende eliminar antecipadamente as incertezas relativas à macroeconomia e às eleições presidenciais do Brasil em 2022. Isso é impossível. Seus propósitos são: (1) ajudar os leitores a organizar e reduzir suas incertezas sobre o tema; e (2) constituir o ponto de partida para uma atualização sistemática dessas “cartas de navegação” em meio às incertezas. A responsabilidade pelo conteúdo e forma do texto é do coordenador Claudio Porto.

    Claudio Porto & Equipe Macroplan[1]. Junho de 2022

    1. Incertezas Críticas para 2022

    Daqui a pouco mais de 5 meses, se tudo correr como nos últimos pleitos, já saberemos quem foi eleito para governar o Brasil de 2023 a 2026. Por enquanto, muitas incertezas e algumas tendências pairam entre nós.

    Na nossa visão inicial, em novembro de 2022[2], destacamos duas incertezas entre as demais:

    1. Uma política: qual a chance de um terceiro candidato(a) passar para o 2º turno contra um dos dois atuais preferidos nas pesquisas de opinião (Lula ou Bolsonaro)?

    2. Outra econômica: qual a probabilidade da economia brasileira em 2022 melhorar sensivelmente, por exemplo um crescimento econômico maior que 2,5% e inflação menor que 8%?[3]

    Os desdobramentos e combinações dessas duas incertezas configuram cenários que, ao longo do tempo, teriam suas chances de ocorrência alteradas em função das percepções e expectativas dos eleitores brasileiros.

    Mas, desde então, uma terceira incerteza evoluiu tão intensamente que também se tornou “de primeira grandeza”, e não deve mais ser ignorada pelos decisores de empresas privadas ou negócios públicos, especialistas no tema ou formadores de opinião:

    3. Uma incerteza institucional: qual a chance do candidato a Presidente nas eleições de 2022 tomar posse e governar se o(a) vitorioso(a) não for o atual Presidente?

    2. Expectativas Atuais e Probabilidade dos Cenários Eleitorais

    Para atualizar a avaliação de tais incertezas e as tendências derivadas, e também avaliar a probabilidade atribuída à 3ª incerteza, a equipe da Macroplan, sob a coordenação do economista Claudio Porto, realizou uma nova sondagem de expectativas[4] junto a 500 integrantes das redes da empresa no período de 1 a 16 de junho de 2022. Como usual, as pessoas sondadas pela Macroplan são bem-informadas e constituem uma amostra não aleatória de executivos, políticos, gestores, acadêmicos e especialistas dos setores privado, público e do 3º setor de todo o Brasil. Têm visões de mundo e convicções diversificadas. Obtivemos 325 respostas (taxa de respostas de 65%), cujo efeito cruzado configura quatro cenários distintos para os desfechos das eleições presidenciais de 2022.

    Para uma melhor avaliação, as figuras abaixo comparam os resultados das duas pesquisas

    Quatro Cenários para as Eleições Presidenciais – Brasil 2022Sondagem de Novembro de 2021

    Quatro Cenários para as Eleições Presidenciais – Brasil 2022Sondagem de Junho de 2022

    O cenário mais provável, com 57% de chance, segundo as expectativas dos respondentes, é de polarização Lula e Bolsonaro no 2º turno, com crescimento econômico baixo (ou mesmo nulo ou negativo) e inflação superando os 8% a ano. Um cenário que tende a favorecer o candidato Lula.

    Hoje, o 2º cenário mais provável, com 26% de chance, é de um 2º turno com uma polarização Bolsonaro x Lula mas com um panorama diverso: a economia cresce com mais vigor, talvez superando os 2,5% ao ano e a inflação no máximo fica em torno dos 8%. Um panorama que supostamente seria mais favorável à reeleição de Bolsonaro.

    O 3º cenário mais provável seria de uma disputa entre um 3º candidato e Lula, também em um contexto de crescimento econômico baixo e inflação significativa. É prematuro antecipar um favorito.

    Por fim, o cenário que continua avaliado como menos provável, com apenas 5% de chance de ocorrer, segundo os respondentes da sondagem da Macroplan, é de um confronto entre um 3º candidato e Bolsonaro num contexto de economia em expansão e inflação cadente.

    Houve mudanças significativas de expectativas, quando comparamos os resultados das duas sondagens. A mais importante é que polarização Bolsonaro x Lula, com maior chance de sucesso para Bolsonaro, passou a ser o 2º cenário eleitoral mais provável (antes era o 3º). Inversamente, as chances da 3ª via ir para o 2º turno caíram 23 pontos (de 41% para 18% da 1ª para a 2ª sondagens).

    Ainda continua sendo muito cedo para fazer apostas mais firmes, pois o Brasil é um país fértil em instabilidades e surpresas. O jogo político ainda está aberto. O crescimento da economia, ao que a maioria dos sinais indica, continuará em marcha lenta embora com pequenas melhoras; mas a inflação segue renitente. Nesses dois indicadores, nossa situação média é pior em comparação com o mundo, segundo monitoramento do Financial Times

    Fonte: Financial Times com base em dados do Consensus Economics.

    3. Terceira incerteza: Quem ganhar toma posse e governa, se não for Bolsonaro?

    Qual a chance do candidato a Presidente nas eleições de 2022 tomar posse e governar se o vitorioso não for o atual Presidente? Expectativa dos respondentes desta sondagem de junho de 2022: 77%.

    Essa incerteza já estava no “nosso radar” desde 2021 e no relatório da 1ª sondagem, de novembro de 2021, e foi enunciada nesses termos: “No caso dos cenários da eleição presidencial brasileira devemos considerar (a tentativa de) um golpe. Por exemplo: caso Trump e invasão do Capitólio na última eleição presidencial americana; ou ameaças no Brasil dia 7 de setembro de 2021”

    Nossa sondagem aponta: 23% da opinião média dos respondentes aponta alguma possibilidade de “golpe”.

    Numa democracia essa pergunta não teria cabimento: há a certeza de quem quer que vença os perdedores aceitarão pacificamente a derrota. A erosão de nossa democracia não é recente, mas agudizou desde o ano passado[5]. As referências a essa possibilidade tornaram-se cada vez mais frequentes na nossa mídia e entre pesquisadores e/ou formadores de opinião de grande reputação.

    Danilo Medeiros, em artigo publicado no jornal Valor Econômico de 09 de maio de 2022[6] ressalta que “Golpes militares tornaram-se raridade nas últimas décadas, mas isso não significa que as erosões e quebras democráticas deixaram de existir… O autogolpe pode se dar por caminhos e estratégias variadas (e) Bolsonaro flerta com esse caminho ao questionar a lisura do processo eleitoral brasileiro e afirmar que pode não aceitar os resultados que sairão das urnas em outubro de 2022 … O maior …estrago feito por Bolsonaro é a incerteza da posse de qualquer candidato eleito nas eleições de outubro que não seja o atual presidente.”

    Na mesma linha, mas com nuances muito instigantes, Merval Pereira publicou recentemente[7]A mais recente cartada está sendo organizada mais uma vez para o dia 7 de Setembro, em que se comemorará o Bicentenário da Independência do país. A utilização de data tão simbólica para confrontar as instituições, a menos de um mês das eleições, prenuncia a intenção de impedir que elas se realizem. Bolsonaro afronta o STF e o TSE dia sim, outro também… Seu parceiro Donald Trump, está às voltas com a Justiça nos Estados Unidos, acusado formalmente de ter tentado um golpe de Estado … Bolsonaro vai pelo mesmo caminho, e o TSE e o STF já deram mostras de que não estão brincando ao confirmarem a cassação dos mandatos de dois deputados bolsonaristas por divulgarem fake news pela internet. Muitos começam a achar que ele está querendo ser cassado, para escapar de uma derrota que parece inevitável e poder alegar que está sendo perseguido pelo “sistema”.

    Uma avaliação ainda mais profunda do tema, e com conclusões também instigantes e preocupantes foi feita pelo pesquisador Marcos Nobre[8]: “O campo democrático continua jogando amarelinha eleitoral enquanto Bolsonaro monta o octógono de MMA do golpe. Que ele dará como for possível. Conseguido a reeleição e fechando o regime desde dentro, produzindo um caos social duradouro, aguardando o fracasso do seu sucessor e as eleições de 2026, ou dando um golpe em moldes mais clássicos. Perdendo ou ganhando a eleição em 2022, o bolsonarismo já ganhou.”

    4. O que é muito provável para o cenário eleitoral e pós-eleitoral (pelo menos até a posse dos eleitos)

    Usando uma expressão corriqueira do mercado financeiro, “já está contratado” que no Brasil em 2022 teremos um cenário eleitoral radicalizado e tumultuado. Nos mundos presencial e virtual. Antes, durante e após as eleições. A incerteza remanescente é até quando esta onda perdurará.

    5. Fontes de Incerteza que continuaremos a monitorar

    As expectativas dos atores relevantes (no caso, os candidatos, seus blocos de apoio e os eleitores) evoluem sob a influência muitos fatores. Na nossa avaliação, três fontes de incerteza devem merecer atenção especial e monitoramento sistemático (1) a evolução da COVID-19 e da saúde pública no Brasil; (2) a evolução da inflação e da massa real de renda das pessoas; e (3) o inesperado.

    » 1 ª Fonte de Incerteza: A evolução da COVID – 19 e da saúde pública no Brasil

    A intensa e veloz disseminação de novas mutações do vírus da COVID-19 (sendo a Ômicron a mais “popular”) é um sinal de alerta com a evidência de que (infelizmente) é cedo para considerarmos definitivamente superada a possibilidade de novas ondas da pandemia do COVID-19.

    COVID- 19 – Brasil – Novos casos e mortes

    Fonte: JHU CSSE COVID-19.

    No entanto, com quase 80% de nossa população vacinada (ciclo vacinal completo – 2 doses ou dose única) a média de mortes causadas pela pandemia é de uma outra ordem de grandeza (felizmente muito menor) do que a das “ondas anteriores”. Evidência robusta de que a vacinação protege e é eficaz.

    Uma questão crítica para nós brasileiros, nesse campo é: em 2022 e 2023 é: como evoluirá o perfil epidemiológico mais amplo de nossa população?

    » 2 ª Fonte de Incerteza: A evolução da inflação e da massa real de renda das pessoas

    O aumento de preços em 2021 já era esperado em todo o mundo, não só da grande queda de preços ocorrida em 2020 mas também da ruptura e/ou rearranjo das cadeias de suprimento e da reconfiguração dos mercados de bens e serviços e de força de trabalho por conta da pandemia da COVID-19. Mas agora o aumento de preços tem sido mais intenso, duradouro e generalizado pois foi alavancado pelas consequências da invasão da Ucrânia pela Rússia.

    No caso brasileiro esse aumento está ocorrendo com muito mais força, velocidade e amplitude. A “desancoragem de expectativas inflacionárias” (defasagem da relação entre as expectativas do mercado e as metas de inflação do Banco Central) é uma narrativa que está em expansão[9].

    As medianas das expectativas para 2022, segundo comunicado do Banco Central com a atualização parcial da Pesquisa Focus (06/06/2022), são de 8,89% para a inflação e de 1,2% para o PIB, respectivamente. A última edição completa do Boletim Focus foi publicada em 22 de abril deste ano. Desde então, as edições completas estão suspensas em virtude da greve dos funcionários do Banco.

    Na última edição do Boletim Macro, do IBRE (maio, 2022), a desaceleração apresentada pelo IPCA de abril não coloca um ponto final nas pressões inflacionárias. A taxa em 12 meses, hoje em 12,16%, deve se manter acima de 10%, pelo menos até agosto, antecipando que a trajetória de desaceleração da inflação será lenta e menor que a prevista no início do ano. O cenário de incerteza com a guerra entre Rússia e Ucrânia, os casos de Covid-19 na China e o risco de nova desmobilização das cadeias produtivas acirra as tensões sobre o futuro dos preços, o que impõe maior vigilância quanto à tendência da inflação”.

    Já o IBGE[10] estima que a taxa de desocupação caiu para 10,5% no trimestre móvel referente aos meses de fevereiro a abril de 2022, com um contingente de pessoas ocupadas de cerca de 96,5 milhões de pessoas, uma ampliação de 10,3% em relação mesmo trimestre do ano anterior (uma melhora, numa situação muito ruim). Já o rendimento médio real recebido pelas pessoas ocupadas foi estimado em R$ 2.569 no trimestre de fevereiro a abril de 2022, estável frente ao trimestre de novembro de 2021 a janeiro de 2022 e 7,9% menor em relação ao mesmo trimestre do ano anterior. Mas a massa de rendimento real, estimada em R$ 242,9 bilhões para fevereiro-abril de 2022 ficou estável em relação a um ano atrás. Em síntese, paramos de piorar, mas ainda estamos numa situação muito ruim.

    Por último: a pesquisa “A Montanha-Russa da Pobreza” da FGV Social de 15 de junho deste ano, estima que a parcela de pessoas em condição de pobreza no total da população brasileira avançou de 7,6%, em 2020, para 10,8%, em 2021. “A renda mensal dos 10% mais pobres já vinha em queda antes da chegada da covid-19 ao Brasil e despencou a menos da metade no início do isolamento social (R$ 114 em novembro de 2019 a R$ 52 em março de 2020). Desde este mínimo, a renda do grupo foi mais do que quadruplicada até seu pico histórico em agosto do mesmo ano (R$ 215), na fase mais generosa do Auxílio Emergencial (AE). Daquele valor de pico, desabou, ficando 15,8% abaixo do nível pré-pandemia (R$ 96 em novembro de 2021). Este último projeta tendência negativa pois incorpora os valores nominais fixados do novo Auxílio Brasil face o cenário prospectivo de inflação alta, especialmente para baixa renda”.

    »  3 ª Fonte de Incerteza: o inesperado

    O inesperado acontece com maior frequência do que imaginamos. Às vezes sequer os imaginamos. São eventos plausíveis que hoje têm baixa probabilidade de ocorrência, mas que carregam enorme impacto potencial.

    No caso dos cenários da eleição presidencial brasileira devemos considerar pelo menos as seguintes possibilidades:

    1. A possibilidade da narrativa de um(a) do(a)s candidato(a)s não favoritos viralizar e ele(a) disparar nas intenções de voto.
    2. (tentativa de) assassinato de um(a) do(a)s candidato(a)s. Um caso antecedente brasileiro: a “facada” no candidato Jair Bolsonaro, em Juiz de Fora, no dia 6 de setembro de 2018.
    3. Morte súbita de um candidato real ou potencial. Dois antecedentes brasileiros: Eduardo Campos em 2014; e Aécio Neves (morte moral com o “Joesleygate”, revelado em maio de 2017)

    Como se vê, até na geração do inesperado somos um país muito fértil. Vamos monitorar!


    [1] O Coordenador faz um registro especial aos seus colegas Elimar Nascimento e Sérgio Buarque (pela avaliação dos resultados da sondagem e seus prováveis desdobramentos), Thiago Gallian (pelo projeto e operação da sondagem) e Ivy Ribeiro (pesquisas de dados e análises complementares)

    [2] Novembro, 2011 (Quatro cenários para as eleições presidenciais de 2022) – 1ª Sondagem

    [3] Na nossa sondagem de novembro a expectativa de inflação para 2022 inserida na pergunta foi de 5,5% (mediana das expectativas da pesquisa Focus/Banco Central daquela época). A mediana mais recente, segundo a mesma fonte, é de 8,89%.

    [4] A 1ª sondagem de expectativas foi feita no período de 9 a 16 de novembro de 2021 junto a 250 integrantes das redes da empresa. Foram obtidas 141 respostas, uma taxa de resposta de 56%.

    [5] Uma nota pessoal: este coordenador (Claudio Porto) e Sérgio Buarque, escrevemos juntos um ensaio para uma série “Cisnes Negros” que a Macroplan se esforçou para lançar em 2021 mas foi impedida pela intensificação da pandemia da COVID-19. Seu título é “O Caminho da Perdição ” e o Subtítulo “Vai ter golpe? Como seria o Brasil se a ruptura democrática ocorresse?

    [6] “Polarização e eleições”, Valor Econômico – edição de 06/05/2022. Medeiros é pesquisador de pós-doutorado do Cebrap e doutor em Ciência Política na Universidade de Virgínia.

    [7] “O avesso do avesso”, O Globo, edição de 12/06/2022

    [8] Presidente do Cebrap e professor de filosofia da Unicamp. O artigo “O hacker do sistema político”, publicado na Revista Piauí de junho (edição 189) é um trecho do livro “Limites da Democracia: De junho de 2013 ao Governo Bolsonaro”, a ser lançado pela editoria Todavia.

    [9] O centro e o teto das metas de inflação do Banco Central são, respectivamente de 3,5% e 5,0% para 2022.

    [10] PNAD Contínua 1º Trimestre de 2022, publicada em 31/05/2022