Em Correio Braziliense – por Hamilton Ferrari e Renato Souza
78 milhões de brasileiros não têm acesso a direitos básicos, aponta IBGE
Em 2017, quase 78 milhões de pessoas não tinham acesso a saneamento básico, 27 milhões viviam em domicílios com inadequação e 58 milhões sofriam restrição à educação
Com grau preocupante de desequilíbrio nas contas públicas e ineficiência de políticas para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros, o país terá grande desafio para reverter a alarmante precariedade dos serviços públicos. Estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou que milhões de pessoas não têm acesso adequado a direitos básicos, como moradia, saneamento e educação. O presidente eleito, Jair Bolsonaro, terá não só de alcançar o equilíbrio fiscal do país, mas também aumentar a produtividade do setor público, avaliam especialistas.
Após o pleito de outubro, os governadores eleitos se reuniram com o futuro chefe do Executivo nacional para tratar da ampliação do acesso aos recursos públicos. A equipe econômica do governo de transição disse que falta dinheiro para concretizar a vontade dos gestores, situação que vai permanecer enquanto mudanças estruturais não forem implementadas no Brasil.
De acordo com o IBGE, em 2017, 27 milhões de pessoas viviam em domicílios com inadequação, sendo que 12,2 milhões estavam em “adensamento excessivo” — quando a residência tem mais de três moradores por dormitório. Além disso, quase 78 milhões de pessoas não tinham acesso a serviço de esgoto. Especialistas defendem que as atuais políticas de saneamento não estão sendo suficientes para mudar a vida dessas pessoas.
Os dados educacionais também desanimam. Apesar da meta do Plano Nacional de Educação (PNE) de universalizar o acesso de crianças de 4 e 5 anos a escola ou a creche, uma obrigatoriedade prevista em lei, o percentual ficou em 91,7%. Pelo estudo, mais de 58 milhões de brasileiros tinham restrição de acesso à educação.
O professor Sérgio Praça, pesquisador da Escola de Ciências Sociais da FGV-RJ, destacou que os problemas são históricos e precisam de grande esforço político para serem resolvidos. “A partir da Constituição de 1988, se assumiu o compromisso de universalizar a saúde e a educação. No entanto, nesse período, ocorreram diversos erros. Muitos cometidos por conta de escolha política. Por exemplo, no governo Lula se investiu mais no ensino superior. É claro que é necessário, mas não pode deixar a educação básica descoberta”, disse.
Praça afirmou que as políticas públicas voltadas para serviços básicos devem ser aliadas com a melhoria dos indicadores econômicos. “Todos esses problemas refletem o baixo crescimento econômico, ou a retração da atividade econômica. Uma boa opção são programas de transferência de renda, como o Bolsa Família. Mas só isso não vai resolver todos os problemas”, ressaltou.
Dinâmica perversa
O economista Claudio Porto, presidente da MacroPlan, ressaltou que o Brasil chegou a tal ponto de desequilíbrio fiscal que não há mais espaço para conflitos distributivos. Na interpretação dele, o país precisa passar por uma série de reformas que interrompam privilégios de pessoas e setores. Também frisou ser necessária uma revisão de subsídios e veto a reajustes de servidores diante de um contexto fiscal preocupante.
“Atualmente, estamos vivendo uma dinâmica perversa em que a alocação do gasto não está ocorrendo de forma adequada”, disse Porto. “Além disso, nós temos níveis de produtividade na área pública que são escandalosos. Temos de criar ambiente para a modernização da máquina pública e reverter esse quadro que atinge a população”, emendou. Segundo o IBGE, as pessoas consideradas pretas ou pardas sem cônjuge e com filhos têm mais restrições a direitos e serviços. Elas continuam a predominar entre os mais pobres, de acordo com a pesquisa.